No final da década de 80, início da década de 90, com a entrada de Portugal na, então, CEE e a suposta obrigatoriedade de serem transpostas e aplicadas várias convenções internacionais sobre política laboral, criou-se nas camadas mais jovens uma grande esperança no futuro.
A tão propagandeada evolução a que o país iria assistir e as oportunidades nacionais e internacionais que iríamos ter, fez com que milhares de jovens sonhassem com um futuro risonho e com uma vida algo diferente da que os seus pais tiveram, durante as décadas de ditadura e a posterior instabilidade política e social que se seguiu ao 25 de Abril.
À medida que íamos terminando o secundário e os tão famosos cursos Técnico-profissionais, depois chamados Tecnológicos, ou ingressando na Universidade, acreditávamos que o sonho de um emprego estável seria possível. Afinal, para que serviriam tantos anos de investimento e sacrifícios financeiros de milhares de pais que ambicionavam o melhor para os seus filhos?
A pouco e pouco fomos observando o céu e verificámos que não era só composto de um azul infinito, do sol ou das estrelas; havia também nuvens, e cada Governo que chegava ao poder, encarregava-se de escurecer a tonalidade das nuvens já existentes e semear outras para que alguém as escurecesse depois.
Assim aconteceu com o Código do Trabalho; com as politicas sociais e de emprego, ou melhor, desemprego; com o financiamento de projectos sem qualquer sustentabilidade e prospecção futura; com a entrega ao desbarato de fundos comunitários a empresários sem escrúpulos, que hoje deslocam as suas empresas para qualquer parte do mundo, onde seja mais fácil explorar seres humanos, pois os trabalhadores portugueses agora deram na mania de não querer ser mais explorados – vejam só!
Com esta mania que os trabalhadores portugueses inventaram de se recusar a ser explorados pelas mesmas famílias de abutres de sempre, - sim, de sempre, porque algumas emigraram após o 25 de Abril mas já cá estão todas outra vez – os Governos de Direita e, agora este, que a ser julgado pelas medidas de Sócrates já se pode definir como de “Direita Radical”, esforçaram-se por cortar o mal pela raiz, ou seja, inventaram a necessidade de haver Trabalho Precário.
As empresas produtivas abandonam o país, mas em compensação os Governos criam as melhores condições, para a proliferação e desenvolvimento das Empresas de Trabalho Temporário e dos Outsourcings, com a desculpa de fazer face às leis do mercado, da competitividade e da concorrência própria da globalização.
Tudo isto, são desculpas para camuflar a realidade trazida pela subcontratação, prestação de serviços através de falsos recibos verdes ou estágios que nunca mais acabam, incluindo no próprio Estado.
As novas gerações vêem-se assim num pântano laboral, onde impera a lei do mais forte e que trouxe consequências tão graves como:
Os baixos salários e exploração de milhares de pessoas, na sua maioria jovens entre os 18 e 35 anos;
Incerteza completa no futuro após os 35 anos de idade, visto que é nesta altura que as empresas responsáveis pela exploração das capacidades dos jovens, se descartam deles considerando-os velhos para as funções;
A impossibilidade de se construir uma carreira profissional estável, apesar do elevado nível académico dos trabalhadores;
Substituição de um ordenado condigno pelos mais variados prémios que, para além de desfalcar a Segurança Social, - visto que a esmagadora maioria da empresas não faz descontos em relação a estes prémios – desprotege gravemente os trabalhadores que, perante situações de Baixa Médica, Desemprego ou Reforma futura, vão receber apenas 65% do Ordenado Base declarado.
Desencoraja os jovens a constituir família, contribuindo para a baixa taxa de natalidade, que o país tem vindo a registar;
Torna difícil a acção sindical e a luta de trabalhadores, visto que estes têm medo de se manifestar devido aos vínculos precários;
Permite a perseguição sindical e chantagem com ameaças de despedimento imediato aos mais precários e impossibilidade de celebração futura de contratados sem termo, para os contratados a prazo;
Dificuldade em provar a ilegalidade desta selvajaria laboral, pois os Governos criaram e continuam a criar condições para que os responsáveis continuem impunes, não obrigando a I.G.T. a desempenhar o seu papel e aprovando legislação ambígua e desadequada.
Os Governos de Portugal e o patronato (liderado por grandes grupos económicos que antes estavam na sombra dos governos, mas que agora já se assumiram descaradamente ensinando ao actual Governo como implementar as políticas que mais os favorecem), pariram um monstro chamado Trabalho Precário, roubaram o futuro a milhares de jovens e destruíram muitos sonhos. Por isso Srº Primeiro Ministro, há-de ouvir falar de nós… pode ser que o provérbio popular “quem semeia ventos colhe tempestades” se realize mais depressa do que V. Exa. imagina…
Os jovens portugueses, não vão permitir por muito mais tempo este estado de coisas e não vão admitir ser identificados como “geração rasca” ou “escumalha”, porque, afinal, a tal escumalha de que o outro fala foi atirada para a exclusão social e para o desemprego por abutres iguais aos que por cá promovem o desemprego e a precariedade laboral!
A haver “geração rasca” ou “escumalha”, teríamos de procurá-las nos pequenos bandos de aves de rapina que ontem e hoje, em Portugal e no estrangeiro tentam alimentar-se o mais que podem das suas vítimas promovendo as desigualdades sociais e a continuação da exploração do homem pelo homem.
É contra esta realidade e por um futuro melhor que os jovens portugueses estão dispostos a lutar. O nosso sonho há-de realizar-se, e as ditas aves de rapina hão-de desaparecer no temporal que as próprias criaram!
Rui Beles Vieira